quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Levanta povo indígena! Levanta povo de luta!


por Elaine Tavares – jornalista

A investida contra as comunidades indígenas está recomeçando com bastante violência no Brasil. Recentes acontecimentos como a completa indiferença do governo diante da luta das comunidades atingidas por Belo Monte ou a destruição do Santuário dos Pajés na região de Brasília mostram que a fúria dos grandes empreendimentos pretende passar o rodo sobre qualquer obstáculo que se interponha entre seu desejo de lucro. Essa não é uma atitude nova, mas, agora, parece que está tomando maior furor, como o que se registrou em Mato Grosso, com o assassinato e o sequestro do corpo do cacique Nísio Gomes, da comunidade Guarani.
Desde a invasão de Pindorama que os indígenas vêm sendo dizimados. Como os que habitavam essas terras não estavam organizados em cidades ou civilizações, como foi o caso dos Maias, Astecas e Incas, ficou bem mais fácil atuar na lógica do genocídio.
Toda e qualquer comunidade que estivesse no caminho dos colonizadores, era imediatamente passada pelo fogo dos arcabuzes, uma vez que não se rendiam à escravidão. Isso foi sistemático até o início do século XX. Os primeiros assassinos de índios foram os bandeirantes, que eram as tropas mercenárias da ocupação, depois, com a chegada dos imigrantes, eles mesmos foram autorizados a darem cabo nos selvagens que atrapalhavam a instalação das cidades e do progresso.  Foi só no século XX que o Brasil iniciou uma nova política indigenista, comandada pelo Marechal Rondon, que tinha como diretriz, dominar sem matar. A proposta das incursões comandadas por Rondon era a de estabelecer a paz, integrar o índio à sociedade brasileira e abrir ainda mais as fronteiras.
Inegavelmente a obra de Rondon  foi um avanço diante do extermínio sistemático, mas ainda assim, a lógica de confinamento em reservas ou a absorção dos indivíduos numa sociedade racista e excludente não se constituiu a melhor solução. Até porque, todo o debate sobre onde deveriam ficar os indígenas não respeitou a ocupação original e muitos foram desterrados de seus lugares de origem, ocasionando a perda de parte de sua cultura e identidade.
Hoje, os indígenas brasileiros seguem lutando pelo direito básico a terra. Grande parte das comunidades não tem seus territórios demarcados e as pessoas vivem praticamente como prisioneiras em campos de concentração, tuteladas pelo governo que pouco lhes dá.  Tudo isso tem levado os povos indígenas a longas batalhas para recuperar seu território, sua cultura e sua forma de organizar a vida.  No geral, a luta não consegue ultrapassar a busca do prosaico direito de comer, tamanha é a indigência das políticas governamentais diante do tema.
Não bastasse todo esse processo de tutelagem/abandono que, na prática, acaba segregando, as comunidades ainda cometem o terrível “crime” de viverem sobre terras muito ricas, o que os torna presas sistemáticas dos grandes projetos nacionais públicos ou privados de “desenvolvimento”. Hoje, no Brasil, são 546 áreas indígenas que congregam mais de 330 mil almas, num total de 170 línguas. A maioria vive enredada em conflitos causados por especuladores, pistoleiros, jagunços.  A tenebrosa batalha pela demarcação da Raposa Terra do Sol é um exemplo concreto de como a nação vê a demanda indígena pela terra. Com declarações estúpidas como: para quê índio precisa de tanta terra?, os empresários e fazendeiros de rapina vêm lutando para barrar essa vitória. E assim, sucessivamente acontece em todos os espaços onde vivem os indígenas.
No Mato Grosso do Sul não é diferente. Lá vivem atualmente mais de 28 mil índios de 38 etnias, com indícios de mais nove povos ainda não contatados. Segundo Flávio Machado, coordenador regional do Cimi, ali se concentra a segunda maior população indígena do país e a que vive em pior situação, uma vez que 98% dela está confinada em pequenas reservas que representam apenas 0,2 do território estadual. Toda essa gente vive acossada pela especulação imobiliária, pelos fazendeiros, pelos grandes empreendimentos. A morte do cacique Nísio era mais uma dessas mortes anunciadas que acontecem todos os dias no âmbito da luta pela terra. Porque ele era um lutador, assim como toda sua gente. O Mato Grosso do Sul é um estado que está na linha do desejo do agronegócio e tem as terras mais produtivas do país. Para aquele estado estão planejadas 30 novas usinas de açúcar e álcool, daí a cobiça dos fazendeiros que querem apostar na monocultura sem risco.
Os conflitos de terra na região remontam ao ano de 1983, quando foi morto o cacique Marçal de Souza, no processo de retorno para as terras originais que havia sido iniciado pelos indígenas. Desde aí, o estado do Mato Grosso do Sul passou a ser uma zona de massacre sistemático. Há dois anos foram assassinados dois professores que viviam em área indígena, assim como há dois meses outra morte foi registrada na mesma área, isso sem contar as ameaças de todos os dias. Tudo isso é feito por um grupo paramilitar que, segundo o Cimi, já foi reconhecido até pelo Ministério Público, uma vez que os ataques são bastante semelhantes, assim como as balas encontradas na região do crime. Para se ter uma ideia do processo de violência no Mato Grosso do Sul, em oito anos foram assassinados 452 índios no Brasil inteiro, sendo que 250 foram no MS. Agora, numa demonstração de completo cinismo, os ruralistas da região exigem reunião com o Ministro da Justiça, porque não estão gostando de estarem sendo considerados suspeitos. Dizem querer justiça, o que no caso deles significa a desocupação das terras pelos indígenas.
A realidade dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul, assim como das demais regiões do Brasil, vive escondida sob o tapete da indiferença e da impunidade. Os meios de comunicação só falam de índio no dia 19 de abril ou quando ocorre uma desgraça. Ainda assim, as reportagens totalmente descontextualizadas não ajudam a que a gente possa fazer uma reflexão crítica sobre a situação real das comunidades. No geral permanece o preconceito criado pelos brancos de que os indígenas são preguiçosos e atrapalham o progresso da nação.
A morte do cacique Nísio Gomes não é uma tragédia pessoal. Ela representa uma tragédia coletiva vivida sistematicamente pelos povos originários dessas terras desde a invasão em 1500. Compreender isso e atuar em consequência é tarefa urgente dos sindicalistas e militantes sociais de todas as áreas. Já basta de impunidade e de tutela. É hora de as nações indígenas terem seus direitos garantidos e desde aí, avançar para a soberania. Nossa tarefa é juntar forças e caminhar junto com o povo indígena nessa grande batalha que haverá de ter um fim.

sábado, 19 de novembro de 2011

Pela luta, denúncia e memória do Cacique Nísio Gomes

 
 


Em destaque: Cacique Nísio Gomes

No início da manhã desta sexta-feira (18),a comunidade Kaiowá Guarani do acampamento Tekoha Guaviry, município de Amambaí, Mato Grosso do Sul, sofreu ataque de 42 pistoleiros fortemente armados. O massacre teve como alvo o cacique Nísio Gomes, 59 anos, executado com tiros de calibre 12. Além de matarem o cacique na frente de seus filhos, família, segundo testemunhos, também outros sofreram várias violências, como: espancamentos, tiros com balas de borracha e outros assassinados... depois o corpo do cacique ainda foi levado por estes assassinos.

Infelizmente, como tem sido, a grande imprensa desse país se cala, omite, ou simplesmente se resume a noticiar muito tempo depois do ocorrido, com versões já descaracterizadas para suavizar...

Fica aqui esse registro, como uma moção de solidariedade e união pela causa afro e indígena. Deixo abaixo a mensagem dessa música em forma de oração, choro e denúncia.



Nosso povo precisa voltar a crer no poder de mudar o mundo (do extermínio, da exclusão, da opressão imposta pelos que se colocam como deuses - no direito de matar, roubar e destruir a vida). Revolucionar, partindo da conscientização política, cidadã, é preciso!



Nesta data também lembramos de um canto entoado muitas vezes pelas CEB's, nas décadas de 80, 90: "Seu nome é Jesus Cristo e passa fome..." É a mensagem que nos deixa o evangelho lido em muitas igrejas neste domingo (que celebra a memória do grande martitizado Jesus Cristo, pela liturgia, pela morte e ressurreição; e também, particularmente neste 20 de novembro, o dia nacional da Consciência Negra, celebrando a luta de outros tantos e tantas líderes que sofrem perseguição nos dias atuais, junto com o povo, massacrado - tal como foi Zumbi dos Palmares).

Imagem destacada: Zumbi dos Palmares (em memória da Consciência Negra)


Socializando... Música - LETRA E VÍDEO:

Entre nós está e não o conhecemos...

Para ver um vídeo e ouvir a melodia, clique no seguinte endereço (do Youtube): http://www.youtube.com/watch?v=X4pGSamRJPM&feature=related 

A letra:
Seu nome é Jesus Cristo e passa fome
E grita pela boca dos famintos
E a gente quando vê passa adiante
Às vezes pra chegar depressa à igreja
Seu nome é Jesus Cristo e está sem casa
E dorme pelas beiras das calçadas
E a gente quando vê aperta o passo
E diz que ele dormiu embriagado

Entre nós está e não O conhecemos
Entre nós está e nós O desprezamos
(2x)

Seu nome é Jesus Cristo e é analfabeto
E vive mendigando um subemprego
E a gente quando vê, diz: é um à toa
Melhor que trabalhasse e não pedisse
Seu nome é Jesus Cristo e está banido
Das rodas sociais e das igrejas
Porque d'Ele fizeram um Rei potente
Enquanto Ele vive como um pobre

Entre nós está e não O conhecemos
Entre nós está e nós O desprezamos
(2x)

Seu nome é Jesus Cristo e está doente
E vive atrás das grades da cadeia
E nós tão raramente vamos vê-lo
Sabemos que ele é um marginal
Seu nome é Jesus Cristo e anda sedento
Por um mundo de Amor e de Justiça
Mas logo que contesta pela Paz
A ordem o obriga a ser de guerra

Entre nós está e não O conhecemos
Entre nós está e nós O desprezamos
(2x)

Seu nome é Jesus Cristo e é defamado
E vive nos imundos meretrícios
Mas muitos o expulsam da cidade
Com medo de estender a mão a ele
Seu nome é Jesus Cristo e é todo homem
E vive neste mundo ou quer viver
Pois pra Ele não existem mais fronteiras
Só quer fazer de todos nós irmãos

Entre nós está e não O conhecemos
Entre nós está e nós O desprezamos
(2x)

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Assim, atualizamos esta mensagem para os nossos dias, ajude a denunciar o massacre do povo Guarani em Dourados, ocorrido no dia de ontem e todos os massacres ocorridos no decorrer de nossa história.

Nos juntemos para lutar e acreditar num mundo novo, pela igualdade, justiça e paz!


Consciência Popular de resistência!
 

domingo, 13 de novembro de 2011

A crise européia vista desde África / Globalização de quê?


A crise européia vista desde África
por Vatican Insider, 07-11-2011
Tradução de Reinaldo João de Oliveira

Em meados dos anos 80, muitos estados africanos sofreram políticas de “ajustes estruturais”, sugeridas ou impostas pelo FMI e o Banco Mundial, que recortaram o gasto social e que tiveram um efeito devastador em suas economias. Hoje “Europa parece, em parte, querer dirigir as mesmas políticas até suas próprias nações”.
Assim afirma a Radio Vaticana, que entrevistou o economista Riccardo Moro, diretor da Fundação Justiça e Solidariedade da Conferência Episcopal Italiana (CEI), e o jornalista africano Filomeno Lopes. “Hoje na Europa há quem, como o presidente do BCE, Draghi, pede também políticas expansivas para sair do lugar onde estão”, explicou Moro. “No entanto, é certo que no passado, o ocidente tem interferido com arrogância na crises dos países em vias de desenvolvimento e somente agora, graças ao trabalho da sociedade civil, parece haver aprendido um pouco a lição”.
Antes de indignarmos pelas políticas dos governos europeus em tempo de crises – questionou Filomeno Lopes – talvez deveríamos refletir sobre onde estávamos quando políticas inclusive piores se impuseram aos países em vias de desenvolvimento. E perguntando-nos se hoje não estão pagando, em parte, as conseqüências daquela indiferença. Ver a crise europeia desde o ponto de vista africano pode ser útil, para obter um ensinamento dos sofrimentos vividos por estas populações
Muitos africanos que sofrem por falta de alimentos ficariam perplexos ante a dramatizatização com a que se descreve a crise econômica da União Europeia”, indicou Filomeno Lopes. “Se bem é certo – concluiu – que a crise da economia ocidental tem a ver com cifras muito altas das que se manejavam na economia africana, também é certo que no continente negro vivem muito mais pessoas. Aliás, aquelas crises os deixavam indiferentes...

Comentário:

Globalização de quê?
Por Reinaldo João de Oliveira
Antes de tudo, caberia perguntarmos se o debate atual sobre a Globalização, na perspectiva dos países desenvolvidos, reflete também a lógica hegemônica do Mercado que segue mais, que tudo, determinado pela referência do Capital. Nisso, vemos que o a conjuntura política que se estabelece “globalmente” em termos de ajuda, ou ajustes fiscais, aos países em crise financeira – ditado pela corrente geral da nova onda capitalista.
A partir de uma importante contribuição de Milton Santos, em uma de suas reflexões descritas na obra “Por uma outra Globalização...” (SANTOS, Milton, 2000)[1], podemos perceber quais os ditames da política para o setor financeiro global, em referência aos demais países que compõem outros grupos em perspectivas de luta social, desenvolvimentos outros “para além” dessas correntes de mercado global.
Trago à lembrança uma charge que reflete de modo irônico qual é a verdadeira política de globalização aos países pobres no mundo, responsável de diversas formas à exclusão imposta às populações periféricas, dos países subdesenvolvidos. Essa charge traz em linguagem irônica a seguinte frase, colocada na boca de uma criança Somali, aparentemente desnutrida e com um prato vazio em suas mãos: - “Por que não globalizam um prato de comida?
Será que nestes ambientes, onde somos também nutridos por tantas ideologias de mercado, junto à outras tantas possibilidades, sabemos diferenciar a globalização das in-justiças sociais, presentes em nosso meio, e que, infelizmente, passa despercebida? Ou será que essas realidades são mascaradas e aí são suplantadas, e suavizadas, aos nossos olhos e mentes... onde globalização não passa de um “termo passivo” no consciente coletivo das massas, onde o pensamento único não interfere a consciência universal, ou apenas deixa estagnada em uma visão global, sem a pretensão do agir local?


[1] SANTOS, Milton. Por uma outra globalização - do pensamento único à consciência universal. São Paulo: Editora Record, 2000.

Pessoas desaparecidas